Ontem e hoje....

Ser livre, correr por entre arbustos espinhosos e arranhar as pernas, pegar nos galhos soltos que outrora se encontravam no alto dos pinheiros e dispô-los de forma a construir algo. Sentir a brisa límpida, sem odores e fresca que me desalinhava o cabelo, atar farrapos do que antes havia sido uma camisa de marca, a um pau espetado na terra cheia daquilo que a natureza lhe provém, qual bandeira em riste a marcar a nossa presença. Escavar buracos imensos, ficando com as mãos enegrecidas e doridas, pois na nossa imaginação, se cavasse-mos o suficiente encontraríamos um novo mundo. Com campos que pareciam não acabar, flores de cores variadas e luminosas e com o sol a aparecer por entre os montes aquecendo-nos a pele...
Tirar bolachas e tangerinas de uma pequena mochila axadrezada de azul, amarelo e vermelho. Sentar-mo-nos no monte a olhar o horizonte e provar-mos aquilo que para nós era o melhor lanche de sempre. Gargalhar depois de reparar-mos que não eram só as nossas mãos que estavam enegrecidas da terra mas também os nossos rostos suados e corados do esforço tinham linhas de sujidade, perceber que ao chegar-mos a casa íamos ser repreendidos: "Já para a banheira, estão todos sujos"!

Sim, todos os dias ouvia-mos isso. Todos os dias chegava-mos a casa sujos, suados e claramente satisfeitos com o nosso dia. Todos os dias pensei que ser criança era a melhor profissão do mundo. Não me importava o dinheiro, não conhecia a maldade e era tudo fácil. Todos os dias estava com as pessoas que mais gostava, todos os dias tinha contacto directo com a natureza. Todos os dias tocava a relva, via os pássaros, descobria ninhos, dava festas a cães vadios, saltava muros e explorava caminhos e lugares que me fascinavam tanto pelo seu mistério como por serem supostamente proibidos.

Agora quero o "todos os dias" de antigamente!