sexta-feira, 25 de julho de 2014

De camisa vermelha...

As árvores costumam dançar na rua ventosa, rodeada de prédios e comércio de rua.
De camisa vermelha, ele chegava todos os dias por volta das 10h ao restaurante, mecanicamente limpava os vidros das janelas, o balcão e o chão. Depois começava a sua rotina de observação.
Em frente ao restaurante há uma pequena loja de bairro, os seus olhos mantinham-se atentos ao movimento da empregada que por lá cirandava. Esta tinha sempre algo com que se ocupar, andando de um lado para o outro da loja, de tempos a tempos parava para fumar um cigarro à porta e cumprimentar os transeuntes já seus conhecidos. Um olá seguido de um sorriso, um bom dia com um jogar de cabelo para trás do ombro. Ela não era possuidora de uma beleza fora do normal, chegava até a ser vulgar com o seu cabelo castanho, estatura mediana e sem ser demasiado magra. Vestia-se de forma descontraída, sempre conjugando gangas com t-shirts. Era na altura em que ela parava para fumar, altura essa em que ele decidia que também lhe apetecia queimar um cigarro, que ela se tornava algo mais que normal. Não sabia descrever se eram os movimentos descontraídos e fluidos, a expressão simpática ou os olhos penetrantes que se cruzavam com os seus constantemente nesse curto espaço de tempo, mas algo fazia acelerar o seu batimento cardíaco, sentindo-o furioso no peito.
Julgava-se um tolo por nunca ter trocado mais de duas ou três palavras com ela, e estas tinham surgido apenas por necessidade e não por vontade própria. Nessa tão curta troca de palavras conseguira parecer um anormal engasgando-se e gaguejando cada vez que os olhos dela se fixavam nos seus. Desde esse dia que não se atrevera a dirigir-se a ela de novo, retomando o seu ritual de observação de todos os dias. Mais tolo se sentiu quando depois da conversa ela começou a cumprimenta-lo simpaticamente, todos os dias, como fazia com todas as outras pessoas na rua, e ele nunca lhe retribuiu o cumprimento até que ela desistiu.

De camisa vermelha, passou um pano pelo balcão, distraído, enquanto olhava de 5 em 5 segundos para a porta da loja da frente, já há demasiado tempo que ela não parava para fumar um cigarro, já não devia faltar muito, pensava ele ansioso, começando já a sentir os efeitos do que se passaria daí a pouco minutos, no peito.


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